Quem foi Paul Otlet, o advogado pacifista que sonhou concentrar todo o conhecimento humano em uma rede mundial, previu os tablets e concebeu os celulares.
Texto Diogo Antonio Rodriguez | 01/10/2013 18h27
Disponível em:
<http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/conheca-pre-historia-internet-
55776.shtml?utm_source=redesabril_jovem&utm_medium=facebook&utm_campaign=redesabril_avhistoria>.
Acesso em: 28 fev. 2014.
Paul Otlet imaginou que, no futuro, haveria uma tela onde
se poderia consultar livros, revistas e jornais. E as pessoas usariam pequenos
telefones de bolso para trocar informações. Imaginou uma grande rede mundial
que interligaria continentes e tornaria todo o conhecimento humano disponível,
trazendo compreensão e a paz mundial.
Sob os olhos de hoje, as visões desse advogado belga podem parecer um tanto
óbvias, mas é preciso dar a ele o devido crédito. Em seu tempo, ainda nem se
sonhava com a internet. A telefonia engatinhava. Nas telecomunicações, o rádio
e o correio eram soberanos. Paul Otlet (1868-1944) imaginou a rede mundial de
computadores bem antes que fosse possível dar vida à World Wide Web.
Nascido em uma rica família belga, Otlet foi educado para assumir os negócios
do pai, um industrial e político que enriqueceu construindo ferrovias pela
Europa. Por isso, foi estudar direito na Universidade Livre de Bruxelas.
Formado, trabalhou em um escritório onde começou a ter contato com o que se
tornaria a obsessão e a obra de sua vida: organizar informações.
Otlet em sua mesa de trabalho
Livros do mundo
Classificação
Pioneiros da web
Quem pensou a Internet antes de ela existir
Isaac Asimov (1920 - 1992)
Escritor de ficção científica norte-americano
Marshall McLuhan (1911 - 1980)
Teórico e acadêmico de comunicação canadense
Leonard Kleinrock (1934)
Cientista da computação norte-americano
O primeiro contato com a bibliografia aconteceu quando ajudou a fazer um livro
que compilaria a jurisprudência da Bélgica. Outra importante aquisição
proporcionada pelo direito foi a amizade com o colega de profissão Henri La
Fontaine, que se tornaria senador e ganharia o Nobel da Paz em 1913. Juntos
tomaram gosto pela bibliografia e ambicionaram torná-la uma ciência. Em 1895,
deram o primeiro passo ao criarem o Instituto Internacional de Bibliografia,
cuja missão era reunir todos os livros publicados no mundo até então. Otlet e
La Fontaine eram pacifistas e acreditavam que o acesso universal ao
conhecimento poderia ajudar a construir a paz. Otlet perdeu dois filhos na
Primeira Guerra.
Logo perceberam que o projeto tinha limitações. Para W. Boyd Rayward, principal
especialista na obra de Otlet e professor de ciência da informação das
universidades de Illinois (EUA) e New South Wales (Austrália), o advogado viu
que a bibliografia não seria suficiente para acolher todo tipo de conhecimento.
"Ele então criou uma biblioteca de imagens", diz Rayward. "Suas
ideias foram ficando cada vez maiores." Era necessário guardar e exibir
esse material imenso. Para isso, ele criou o Mundaneum, fundado em 1910 e
dedicado a coletar, organizar e compartilhar tudo o que possuísse informações
relevantes - localizado no prédio do Palais Mondiale (Palácio Mundial), em
Bruxelas. Otlet e La Fontaine não estavam mais limitados a livros: imagens,
jornais e revistas também eram considerados fontes de conhecimento.
Classificação
Ao mudar a maneira de arquivar conhecimento, Otlet criou a necessidade de uma
nova forma de organizá-lo. Só existia a ordem por assunto e era preciso
ampliá-la. Essa seria a única maneira de concretizar outra visão sua: um livro
que reunisse todo esse conhecimento capturado. A "enciclopédia
universal" só seria possível se a classificação dos assuntos fosse a mesma
para todos, em qualquer idioma.
A Classificação Decimal Universal (CDU) cumpria essa função, dividindo todo o
conhecimento humano em dez categorias. Cada uma delas pode se subdividir
infinitamente, para que fosse possível chegar ao maior nível de detalhe usando
números. Usada até hoje, a CDU era a base da ideia dessa enciclopédia.
"Ele fragmentou os livros e fez um sistema de navegação pela classificação
por assuntos - algo que já existia na época, mas que ele sofisticou. Essa
fragmentação do texto contínuo é como um hipertexto", afirma Paola De
Marco Lopes dos Santos, bibliotecária formada pela USP.
Para registrar cada uma dessas entradas, usava-se um cartão de papel de 12 cm
de largura por 7 cm de altura, que se tornou padrão em bibliotecas pelo mundo
todo. Os arquivos do Mundaneum abrigam hoje 16 milhões de cartões
confeccionados por Otlet e sua equipe. Enfileirados, alcançam 6 km. Seguindo a
curva ascendente no tamanho das ideias de Otlet, veio um projeto que o coloca
entre os primeiros pensadores a antever o que hoje conhecemos como internet.
"Ele pensou que se, de alguma maneira, fosse possível criar uma rede
universal de conhecimento e de instituições de conhecimento, poderíamos criar
um novo tipo de mundo, um mundo pacífico", diz Rayward. "Você podia
pedir uma informação para o instituto deles em Bruxelas. Mas era por correio,
não por e-mail."
A Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro fez uma encomenda de 600 mil cartões ao
Mundaneum em 1911, "depois que seu diretor Manuel Peregrino da Silva
esteve em Bruxelas, visitou o Instituto Internacional de Bibliografia e decidiu
importar o sistema de Classificação Decimal Universal", afirma Jacques Gillen,
da Universidade Livre de Bruxelas e que trabalha no Mundaneum.
O mais grandioso de seus projetos foi a Cité Mondiale (Cidade Mundial). Ali
estariam reunidos não só todo o conhecimento em forma física, como também
instituições de cooperação intelectual. Um dos envolvidos no plano foi o
arquiteto suíço Le Corbusier. "Quando a Liga das Nações foi criada, em
1920, Paul Otlet e La Fontaine acreditavam que o Mundaneum podia ser o centro
do Instituto Internacional de Cooperação Intelectual (IICI) criado pela Liga",
diz Gillen. "Como Bruxelas era a sede de várias organizações
internacionais, eles achavam que era o local perfeito para a instituição."
O IICI foi o embrião para o que depois se tornou a Unesco (Organização das
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Os planos de Otlet estavam fadados ao esquecimento conforme se configurava a
situação política, econômica e social que tomou conta da Europa nos anos 30. A
crise de 1929 levou o governo da Bélgica a cortar o financiamento ao Mundaneum.
Em um contexto em que o nacionalismo ganhava força, as ideias de La Fontaine e
Otlet não eram atrativas. "O Mundaneum tinha atividades relacionadas à
paz, como palestras e eventos. Mas, nos anos 1930, a paz não era bem
vista", diz Gillen.
Fechado em 1934, o Palais Mondiale só foi reaberto em 1941. Os alemães, que
ocupavam a Bélgica, transferiram o arquivo para outro prédio. Armazenado em
condições ruins, o trabalho de Otlet se deteriorou. Ele mesmo ficou esquecido
por décadas. Até que, em 1998, o governo belga reabriu o Mundaneum na cidade de
Mons. Em reconhecimento às previsões de Otlet, o Google tem uma parceria com o
Mundaneum para digitalizar seu arquivo e disponibilizá-lo online. No fim das
contas, Paul Otlet inventou a internet? Rayward afirma: "Gosto de pensar
nele como um antepassado esquecido", diz o historiador. "Não há
ligações diretas entre o que estava fazendo e o que foi criado depois, mas ele
estava pensando em novas formas de organizar a informação."
Pioneiros da web
Quem pensou a Internet antes de ela existir
Isaac Asimov (1920 - 1992)
Escritor de ficção científica norte-americano
Imaginou uma rede que interligaria computadores na casa das pessoas a
bibliotecas gigantescas, às quais as pessoas poderiam enviar perguntas para
obter respostas. De uma forma, previu a existência da Wikipedia.
Marshall McLuhan (1911 - 1980)
Teórico e acadêmico de comunicação canadense
Em A Galáxia de Gutenberg, de 1962, previu que as televisões dariam acesso a
repositórios de conhecimento que poderiam ser acessados conforme o desejo de
quem as estivesse comandando e serviriam como instrumento de comunicação para a
troca de informações pessoais.
Leonard Kleinrock (1934)
Cientista da computação norte-americano
Idealizou em 1961 e criou em 1969 a Arpanet, a rede precursora da internet
atual que funcionava na Universidade da Califórnia, em Los Angeles. A primeira
palavra trocada por mensagem foi "login". Hoje, ele faz parte do Hall
da Fama da Internet.
Postado por Felipe Guimarães
Postado por Felipe Guimarães


Nenhum comentário:
Postar um comentário